A gargalhada gostosa de uma criança escutada ao fundo. O jeito de andar altivo daquela mulher elegante. O refrão de uma música ou uma frase escutada que insiste em não sair da cabeça. São dessas pequenas coisas que partem a maioria dos textos aqui publicados. Pequenas coisas que acontecem todo dia à todo momento. Comigo, não necessariamente comigo, com você e com qualquer outra pessoa que se arrisque no perigoso movimento de respirar. Um movimento simples e corriqueiro, tal qual lavar roupa no final de semana.

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Quando uma morte acontece


   Quando uma morte acontece, a vida toda fica por alguns segundos em suspenso. Segundos que podem durar uma vida ou uma eternidade. Durante esse momento, você fica preso em algum lugar entre o presente e o passado, sem noção alguma da dimensão espaço-tempo.
     Quando uma morte acontece, a casa inteira fica triste e tudo o que se faz de diferente é apenas um lapso dentro da tristeza contínua.
     Quando uma morte acontece, de repente seus melhores amigos se tornam as pessoas mais incompreensíveis do mundo. De repente, começam a falar sobre assuntos completamente irrelevantes. E as outras pessoas demonstram uma extrema insensibilidade, por estarem ocupadas com suas próprias vidas.
     Quando uma morte acontece, é absolutamente ineficaz tentar executar tarefas. Pois todas estas mostram desde o início sua ausência de sentido primordial.
     Quando uma morte acontece, falar é algo desnecessário, pois isto tudo contém uma simbologia ampla e própria. E é um absurdo que o mundo exija maior comunicação.
     Quando uma morte acontece, as mulheres belas não saem às ruas, as pessoas em geral evitam olhar em seus olhos e o dia se acinzenta e chove em sinal de respeito.
     A morte expõe violentamente as entranhas do fenômeno de estar vivo. Grita estridentemente a fragilidade em ser humano. Ela desterritorializa toda a ontologia do saber e faz jorrar questionamentos tão juvenis quanto hamletianos.
     A morte choca apesar de sua naturalidade.
     É bastante provável que a morte seja o segundo acontecimento mais comum que exista na vida. Perdendo em números somente para o nascimento, estima-se.
     Na última semana, ocorreram aproximadamente 15.071 mortes em todo o mundo, 1.600 em conflitos na síria, cerca de 84 palestinos  morreram em ataques israelitas na faixa de Gaza, houveram em torno de 63 mortes na onda de crimes em São Paulo.
     Mas na minha vida, foi apenas uma.


*À memória de Clóvis Lima