A gargalhada gostosa de uma criança escutada ao fundo. O jeito de andar altivo daquela mulher elegante. O refrão de uma música ou uma frase escutada que insiste em não sair da cabeça. São dessas pequenas coisas que partem a maioria dos textos aqui publicados. Pequenas coisas que acontecem todo dia à todo momento. Comigo, não necessariamente comigo, com você e com qualquer outra pessoa que se arrisque no perigoso movimento de respirar. Um movimento simples e corriqueiro, tal qual lavar roupa no final de semana.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Coisas que só você e o seu travesseiro sabem

     Eu poderia muito bem me transpor diante dos olhos de todos numa espécie de lupa ampliadora de mim, ou então passar o que resta de meus dias a falar sem parar sobre o que sou e como me sinto. Mas não adianta, por mais que quisesse ter um raio x de minha alma e de meu estado de espírito, por mais compreensíveis que sejam meus amigos e por mais desinibida que seja minha fala... existem coisas que só eu e meu travesseiro sabemos. Algumas delas são por vergonha, mas acredito que a maioria seja por orgulho. Seria demais para meu orgulho me ver despojada dele diante de outrem. Seria por demais desarticulador de mim me ver em carne crua na frente de quem quer que fosse. Quando isto ocorre, em geral, a ferida já criou um primeiro cascão.
     Não, não sou de esconder sentimentos. Ao contrário, gosto de expressá-los, mas, por mais verdadeira e sincera que seja: o que realmente me toca, o que me mostra e mostra minhas profundas fraquezas, isto fica sempre muito bem escondido por trás da exposição de tantos outros sentimentos. Eu me escondo, eu uso uma máscara. E é somente em poucos momentos que deixo alguém ver minha verdadeira face. E isto sempre de forma milimetricamente calculada: o dia, o lugar, a hora, o local e, principalmente, a pessoa. Mas mesmo quando falo de mim com tristeza, não sou jamais o último da tristeza que sinto ou posso ser, é uma tristeza dentro dos parâmetros que os outros conhecem de mim. Pode ser que tenha uma autoestima bastante ferida, mas isto jamais será revelado. Ousadia, irreverência, bom-humor, insurgência, articulação: todas grandes alegorias categóricas.
     Coisas que só eu e meu travesseiro sabemos? Que eu choro. Que eu sou uma boba, uma criança que se afeta com as coisas mais pequenas, com o mínimo de frustração. Ninguém irá saber, mas eu sei que encharquei o travesseiro com lágrimas. Ninguém irá notar, mas eu e ele sabemos que passei noites inteiras sem dormir por não aguentar a expectativa de um mínimo encontro. Jamais perguntarão, mas sabemos que formulei em meus sonhos as mais delirantes fantasias e as mais ilusórias realidades.
     Aquilo que todos pensam que sabem, que todos acham que viram a real face... só eu e ele sabemos que é exatamente o contrário. Os sentimentos mais feios e repreensíveis por esta moralzinha puritana de merda, essas coisas que ‘não se deve dizer’, isto eu conto a ele antes de dormir. E ele gosta, gosta muito, meu travesseiro é um sádico, um libertino, tudo o que há de pior, pois sendo assim nunca me sentirei mal diante dele. Ele aceita tudo, nada lhe assusta, nada recrimina, tudo incita. Pena ser ele o único a saber, não sei se seria aceita se fosse o que realmente sou diante de outros que não sejam... meu esplêndido travesseiro.