A gargalhada gostosa de uma criança escutada ao fundo. O jeito de andar altivo daquela mulher elegante. O refrão de uma música ou uma frase escutada que insiste em não sair da cabeça. São dessas pequenas coisas que partem a maioria dos textos aqui publicados. Pequenas coisas que acontecem todo dia à todo momento. Comigo, não necessariamente comigo, com você e com qualquer outra pessoa que se arrisque no perigoso movimento de respirar. Um movimento simples e corriqueiro, tal qual lavar roupa no final de semana.

domingo, 26 de agosto de 2012

Adoro Café


     Tava andando sem querer, num dia desses qualquer, por entre aquelas ruas estreitas e mal iluminadas lá do centro. Foi aí que, de relance, dobrando a esquina próxima, eu pensei ter te visto (e depois desse tipo de coisa é que eu sempre me pergunto: por que eu penso?). Fui andando mais depressa pra ver se te alcançava, nem sei ao certo se realmente queria falar contigo, mas ao menos à essa altura você seria um rosto conhecido. Dobrei na Augusta com a D. Antônia e nessa esquina de mulheres dois homens mondrongos e carrancudos me aguardavam. Um deles até falou comigo:
     _ Que cê acha que tá fazendo meu?!
     _ Nada... não tô fazendo nada. Desculpa aí.
    _ Fica longe da mina, filho da puta! Ela é minha, caralho! Tu não tem dinheiro pra pagar por ela!
     _ Mas eu não...
     Não consegui terminar a frase. O outro cara saiu logo interrompendo com um direto de esquerda no estômago. Tentei revidar com um direto de direita, mas não fui bem sucedido. Nunca tive inteligência corporal pra luta – é o que dá ser civilizado desde muito cedo. Então, veio o cruzado de esquerda (acho que o cara era canhoto), o gancho de direita bem no queixo e um menor na altura do fígado. Há tempos não lembrava que tinham tantos órgãos assim espalhados pelo meu corpo.
     O “moço educado” disse que você me percebeu te seguindo. Porra! Como cê fez isso comigo?!
     Eu já tava tão fodido que nem quis saber e disse que não tinha importância, que não tinha dinheiro e não precisava pagar, pois sabia como fazer você gemer gostosinho e de graça. Foi nessa hora que ele me deu aquele chute no saco. Não sei se o grito te deixou com pena ou apetite, mas vi um vulto de mulher aparecer no fim da rua logo atrás dos caras. O “moço refinado” te chamou pra confirmar se tinham espancado o cara certo. 
    O barulho do salto alto na calçada era inesquecível, mas aquele perfume tinha algo diferente. “É esse aí, Vanessa?”. Ainda consegui dar uma risada sem fazer doer muito o corpo. Afastei um pouco pra conseguir olhar melhor seu rosto e, adivinha? Não era você. Desde então estou dando um tempo da cerveja.